A igreja do diabo é mais um dos contos machadianos que integra a coleção Histórias sem Data. Assim como os demais contos, Machado de Assis, sutilmente e de maneira muito genial trás idéias fortíssimas com ensinamento moral sob a forma de fábula. Neste conto, temos como personagens principais Deus e o Diabo, e um destaque focando de modo cômico a relação Deus, religião, homem, razão. Nele o Diabo questiona a religiosidade e a maneira de como o homem se comporta mediante suas “obrigações” religiosas. Machado de Assis buscou nesta ficção realista (assim como nos demais contos), compreender os mecanismos que regem o comportamento contraditório Humano, sejam de caráter espiritual ou social e assim, mergulha de maneira profunda na consciência e alma dos seus personagens expondo as fraquezas e “miudezas” que os dominam.
Este conto nos fala do dia em que o diabo quis fundar uma igreja e resolveu ir ter com Deus para anunciar-lhe as boas novas. Segundo ele, estava cansado do papel avulso que exercia sem organização, sem regras, sem cânones, sem ritual, sem nada. Porque não ter uma igreja “séria”, organizada? Assim desta forma poderia concorrer com as demais religiões. Desta forma pensava o pobre Diabo.
E, subindo aos céus falou com Deus dizendo: “Não tarda muito que o céu fique semelhante a uma casa vazia, por causa do preço, que é alto. Vou edificar uma hospedaria barata; em duas palavras, vou fundar uma igreja.” Depois de um profundo diálogo com Deus, o diabo desce a terra para dar início ao seu mirabolante plano.
Começou então a espalhar uma doutrina nova e extraordinária. Tentava dissuadir os homens da idéia que tinham a respeito de si, anunciando a si mesmo como o diabo “verdadeiro e único o próprio gênio da natureza... verdadeiro pai”.
Prometia tudo, mas tudo mesmo aos interesseiros e confusos homens. Após congregá-los deu-lhes a doutrina que consistia em o homem negar os “valores” e aderir às práticas ilícitas tais como: soberba, luxúria, preguiça, avareza, adultério, etc. Dizia ele, que a inveja, a exemplo, era a virtude principal, origens de prosperidades infinitas, virtude preciosa que chegava a suprir todas as outras. Desta forma tudo que era impuro, desonesto, perverso, frio, ganancioso era pregado na igreja do diabo.
Entretanto, passando os anos o diabo percebeu que muitos dos seus fiéis, às escondidas, voltaram a praticar as boas virtudes e isso muito o perturbou, o chocou. “O pasmo não lhe deu tempo de refletir...”. Voltou aos céus para buscar em Deus a resposta deste singular fenômeno. Ao que ouviu trêmulo de raiva: “O que queres tu? É a eterna contradição humana”.
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