segunda-feira, 27 de setembro de 2010

A Cartomante

Por: Michelle Nery Rente

Há mais coisas no céu e na terra do que sonha a nossa filosofia. É com esses dizeres de Hamlet à Horácio que Rita repetia a Camilo em uma sexta-feira de novembro de 1869, quando o mesmo ria dela por ter ido se consultar com uma cartomante.
Rita foi consultar-se com esta que ficava na Rua da Guarda Velha, próximo a casa onde ocorriam os encontros dos amantes na Rua dos Barbonos, onde morava uma comprovinciana de Rita.
 A história começa quando os amigos Vilela e Camilo se reencontram depois de muito tempo sem se verem. Os dois eram amigos de infância, Vilela seguiu  carreira de magistrado e Camilo entrou no funcionalismo, contra a vontade do pai, que queria vê-lo médico. Depois da morte do pai, sua mãe lhe arranjou um emprego público. No começo de 1869, Vilela voltou da Província, onde se casara com uma formosa e tonta dama. Camilo arranjou-lhe casa para o lado de Botafogo.
A convivência entre os três trouxe intimidade. Porém com a morte da mãe de Camilo a amizade entre eles ficou ainda maior. Tanto que foi a partir daí que Rita acabou se tornando mais próxima de Camilo. Eles costumavam ler os mesmos livros, jogavam xadrez e saiam juntos, quando de repente o amor surgiu. Ele tentou fugir, mas já era tarde, Rita o conquistou.
Porém um certo dia,Camilo recebeu uma carta anônima, que lhe chamava de pérfido e imoral, na carta dizia que a aventura de ambos já eram sabida por todos. Ele teve medo decidindo  assim permanecer por um tempo longe da casa de Vilela
O amigo porém estranhou a ausência, e Camilo inventou ao amigo que o real motivo dela seria uma nova paixão do rapaz.
Rita também sentiu com a ausência do rapaz, fazendo assim a procurar uma cartomante para descobrir o motivo do desaparecimento do amante.
Com o tempo, os dois voltaram a se encontrar, combinando um modo de se corresponderem em casos de necessidade.
No dia seguinte, Camilo recebeu um bilhete de Vilela com os seguintes dizeres: ”Vem já, já, à nossa casa; preciso falar-te sem demora.” Camilo que por instantes já desconfiava que seu romance com a mulher do amigo fosse descoberto.
AS palavras de Vilela não saiam da cabeça de Camilo, que a todo instante reelia o bilhete. Camilo tinha medo, imaginou todas as situações possíveis como se Vilela já soubesse de tudo. Pensou até na possibilidade de Rita ter lhe mandado um recado em sua casa. Porém não encontrou nada nem ninguém. Começou a ligar os fatos, desde a carta anônima, até o recebimento do bilhete do amigo.
Se dirigiu então até o Largo da Carioca para pegar um tílburi em direção à casa do amigo. Chegando quase ao fim da rua da Guarda Velha, coincidentemente avistou a casa da cartomante em que Rita se consuntava. Viu porém toda a casa fechada, na mesma hora então que o tílburi teve de parar pois um carroça estava atravacada no meio da rua.
No fim, depois de tanto pensar, contrariando todas as suas opiniões, Camilo então resolve ir na direção da casa. Disse ao cocheiro que esperasse e subiu as escadas na direção da porta. Bateu, e logo em seguida veio uma mulher, Camilo disse-lhe que gostaria de se consultar e ela o fez entrar. Subiram para um sotão por uma escada mais escura que a primeira. Paredes sombria, velhos trastes, e uma pobreza destruíam o prestígio do ambiente.
A cartomante o fez sentar-se diante de uma mesa, abriu uma gaveta e tirou um baralho. Enquanto a mulher as embaralhava, olhava para Camilo. A mulher provavelmente aparentava ter por volta dos quarenta anos, italiana, morena e magra. Postou três cartas à mesa e disse-lhe:
-Vejamos primeiro, o que é que o tráz aqui...o senhor tem um grande susto...
Camilo fez-lhe um gesto afirmativo.
E continuou:
-E quer saber se lhe acontecerá alguma coisa ou não...
-A mim e a ela, explicou Camilo.
A cartomante disse-lhe que esperasse, pegou novamente as cartas e as embaralhou e estendeu-as.
-As cartas dizem-me...
Então ela o declarou que não tivesse medo de nada. Nada aconteceria a nenhum dos dois. Ele, o terceiro ignorava tudo. Falou-lhe também do amor que os ligavam, da beleza de Rita...
Camilo ficou deslumbrado. Ela então recolheu as cartas e fechou a gaveta.
-A senhora restituiu-me a paz ao espírito, disse ele estendendo a mão por cima da mesa e apertando a da cartomante.
Esta que então levantou-se rindo.
-Vá, disse ela; Vá ragazzo innamorato...
Camilo, ansioso por sair, não sabia como pagá-la, ignorava o preço. Pagou dez mil-réis pela consulta. A cartomante pegou o dinheiro e o guardou na algibeira. Ele então desceu as escadas, encontrou o tílburi o esperando e seguiu em direção à casa de Vilela.
Para ele, tudo estava melhor agora e até chegou a rir de seus receios. Constatou então o pedido do amigo ser urgente e não poderia demorar.
-Vamos, vamos depressa, repetia ele ao cocheiro.
No caminho, formulou até um plano para dar a desculpa ao amigo pela demora. O coração, ia contente pensando no que a cartomante previu e as futuras alegrias.
Daí, chegou a casa de Vilela, empurrou a porta de ferro do jardim, subiu as escadas, e mal teve tempo de bater, a porta abriu-se, e apareceu-lhe Vilela.
-Desculpa, não pude vir mais cedo; o que há?
Vilela, portanto não lhe respondeu; fez-lhe um sinal e entram para uma saleta interior. Camilo tomou um susto ao ver Rita morta e ensanguentada. Mal teve tempo de fazer algo, Vilela o pegou-o pela gola, e deu-lhe dois tiros e então estirou-se morto no chão.


Podemos ver nessas duas obras de Machado de Assis, temas, que apesar de terem sido escritos em épocas muito distantes da nossa, podemos concluir que uma das principais características do Realismo,é fazem críticas distintas com temas sociais de diferentes classes.

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